segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Diretores de escolas sabem liderar, dizem os docentes


Os professores confiam na capacidade dos diretores de escola para liderar. A conclusão é retirada de um inquérito realizado a mais de 20 mil docentes do ensino público. Mostra como entendem ser a liderança na escola onde ensinam.

Os professores confiam na capacidade de liderar dos seus diretores. Um inquérito realizado a mais de 20 mil docentes do ensino público mostra a visão que têm sobre o perfil de liderança dominante na escola onde lecionam. Para 50,1% dos inquiridos, o diretor da escola tem atitudes e comportamentos de liderança situacional, ou seja, não age sempre da mesma forma mas de acordo com as necessidades do contexto. 29,4% dos inquiridos identificam uma liderança transformacional, em que o líder é capaz de mobilizar e delegar nos liderados. Apenas 9,6% têm a perceção que há uma ausência de liderança.

O que significam estas respostas? “Que, para uma maioria significativa dos respondentes, o estilo de liderança vai variando, ou seja, que não há um estilo de liderança que seja constante.” Mas também que “há um reconhecimento por parte dos liderados de que os seus líderes têm competência, são capazes de os inspirar, de promover o seu desenvolvimento enquanto profissionais e até de os levar a fazer o tal esforço extra”. É o que sustenta Ilídia Cabral, coordenadora do projeto EDUGEST, Gestão Escolar e Melhoria das Escolas, desenvolvido pelo Centro de Estudos em Desenvolvimento Humano da Universidade Católica do Porto, cujos resultados preliminares foram apresentados esta quarta-feira.

Questionada sobre qual a melhor forma de liderar uma organização escolar, Ilídia Cabral esclarece que “existe uma variedade de estilos de liderança nas escolas”. Diz que não é possível apontar um estilo “ótimo”. Mas dá algumas pistas: “Um bom líder tem de ter conhecimento situacional, capacidade adaptativa e flexibilidade para agir da forma mais adequada mediante os contextos”. Por outro lado, acrescenta Ilídia Cabral, “se o objetivo é a melhoria das escolas, o desenvolvimento profissional e da organização, um estilo de liderança mais transformacional, inspirador e empoderador, em que o líder é reconhecido como alguém que age com integridade, é mais promotor de mudanças”.  

É mais fácil identificar o que seria uma má liderança, pois trata-se simplesmente da ausência de liderança, algo que no questionário remetido aos docentes surge designado por “laissez-faire”. A boa notícia é que apenas 9,6% dos inquiridos deixam antever que na escola onde lecionam não há liderança. Significa isto que “o diretor adota uma atitude muito mais passiva, age apenas quando as situações já estão quase irremediavelmente perdidas ou evita agir”, explica Ilídia Cabral, defendendo que “esta ausência de tomada de decisão é muito negativa para a organização”.

Liderança condicionada
Ilídia Cabral não tem dúvidas de que os dados apontam para “uma tendência de confiança do corpo docente nos líderes escolares”. No entanto, reconhece que “o exercício da liderança está muito condicionado por uma série de contingências políticas”, o que, defende a investigadora, deve levar ao questionamento das políticas educativas e da “eterna questão” de dar maior autonomia às escolas. “Até que ponto um diretor de escola pode exercer determinado estilo de liderança se o contexto não o permite?”

“Quando há um reconhecimento por parte dos liderados de que os seus líderes têm competência, são capazes de inspirar e até levar ao tal esforço extra e ao desenvolvimento profissional, isto só pode significar que temos de dar mais autonomia real aos diretores, porque eles são reconhecidos como sendo capazes.”

A equipa de investigadores do projeto EDUGEST descobriu que um dos entraves à liderança transformacional são os mega-agrupamentos, onde existe um menor contacto dos respondentes com as práticas do diretor e, talvez por isso, uma perceção menos nítida do seu papel. Algo que, explica Ilídia Cabral, “acaba por ser compreensível se pensarmos que a presença de um diretor num agrupamento de escolas com cinco ou mais unidades orgânicas não pode ser a mesma do que quando está a gerir uma única escola. Não pode haver a mesma cumplicidade”.

Apesar do cenário construído com base nas respostas dos professores ser otimista, Ilídia Cabral afirma que “ainda há margem para melhorias”. A liderança não pode andar desligada da gestão, recorda a investigadora, defendendo que muito pode ainda ser feito ao nível da formação para o desempenho de cargos de direção. “É preciso identificar os obstáculos concretos com que os diretores se deparam para poder articular um bom modelo de formação - com suporte teórico sólido, mas virado para a prática e para as situações do dia a dia - que permita desenvolver a capacidade de uma liderança situacional.”

Algumas das variáveis que os investigadores consideraram na análise dos questionários, como a região onde lecionam, os anos de serviço, as habilitações académicas e o género dos inquiridos, mostram diferenças na perceção que os professores têm dos estilos de liderança. Alguns exemplos, dizem respeito às diferenças norte e sul. Assim, os professores do norte tendem a ter uma visão dos diretores como sendo mais transformacionais. Mas, à medida que caminhamos para sul, isso deixa de ser tão visível. Isto porque aumenta a frequência de comportamentos cotados como “laissez-faire”.

Os professores com mais anos de profissão e de “casa” não percecionam os seus diretores como sendo tão transformacionais como percecionam os colegas mais novos na profissão ou na escola. Ilídia Cabral admite que a explicação para este resultado possa estar no ciclo de vida profissional ou no perfil do diretor: “Sabemos que há picos de entusiasmo e de entrega à profissão, mas também pode haver da parte do diretor uma preocupação intencional de inspirar os mais novos, até por uma questão de acolhimento de quem chega à escola”.

Quanto mais elevada é a habilitação dos respondentes mais há a perceção de que os seus líderes são mais passivos e evitativos e menos transformacionais. O resultado, diz a investigadora, pode indicar que os mais habilitados possam estar mais afastados da dinâmica das escolas. “Quem tem mestrado ou doutoramento é muitas vezes percecionado na organização como alguém que pode ameaçar a ordem instituída, o que leva essas pessoas a autoexcluírem-se dos processos que decorrem nas escolas e a ter uma perceção influenciada por causa disso.”  

Em termos de género, as professoras tendem a percecionar os seus líderes como mais inspiracionais do que os professores. E as mulheres diretoras são vistas como sendo mais motivadoras do que os colegas do sexo masculino, que, por sua vez, são identificados como tendo mais frequentemente comportamentos passivos.

Ilídia Cabral alerta, no entanto, que algumas das explicações avançadas para os resultados obtidos “não se tratam de hipóteses testadas”. Os investigadores obtiveram 20 631 respostas, representativas de 18,82% do universo de professores do continente. Foram inquiridos através de um questionário enviado por email pela Direção-Geral de Administração Escolar (DGAE). O estudo financiado pelo EDULOG - Think Tank da Educação, da Fundação Belmiro de Azevedo, tem duração de três anos e prevê também, neste ano letivo, uma recolha qualitativa de dados junto das escolas, através da reconstrução das histórias de vida dos diretores.

Informação retirada daqui



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