Os planos de recuperação nasceram através de um despacho de Dezembro de 2005 que instituiu, também, os planos de acompanhamento e os de desenvolvimento. Se estes últimos se destinam a estudantes com capacidades excepcionais, os de acompanhamento dirigem-se a crianças que ficaram já ficaram retidas e visam evitar reprovações repetidas, sendo aplicados desde o início do ano lectivo. Aos planos de recuperação são submetidos os alunos que apresentam indícios de que poderão vir a reprovar e que são identificados no final do primeiro período (se tiverem classificação negativa a três ou mais disciplinas) ou, então, nesta altura do ano, após os primeiros testes do período, antes das miniférias de Carnaval.
O objectivo dos planos é dar àquelas crianças tratamento especial e individualizado. Os de recuperação, nomeadamente, incluem medidas a desenvolver pela escola (como "acções de pedagogia diferenciada em sala de aula", actividades de compensação ou aulas extra) e implicam o envolvimento do próprio aluno (que se compromete a fazer os trabalhos de casa ou a estar atento nas aulas, por exemplo) e dos seus pais (a quem é pedido que se assegurem de aspectos como a assiduidade e a pontualidade dos filhos ou que vão observando os cadernos diários).
A questão é que os dados mais recentes que o Ministério da Educação (ME) disponibiliza, referentes ao ano lectivo 2007/2008, "não são animadores", como frisou, em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Albino Almeida.
O que falhou?
Num universo de 764 mil alunos contabilizados (os do Centro do país não foram tidos em conta) foram aplicados, naquele ano, 187.638 planos de recuperação e 40.201 planos de acompanhamento, números que surpreenderam o próprio secretário de Estado que assinou o despacho, Valter Lemos. "Seria de esperar que não houvesse tantos alunos com tantas dificuldades", comentou, na altura.
No final do ano, os resultados escolares provocaram manifestações de regozijo comedidas entre os governantes. Apesar de uma ligeira melhoria em relação ao ano anterior, a taxa de reprovações manteve-se alta entre os alunos submetidos aos dois tipos de plano: cerca de um quarto dos elementos de cada grupo não transitou.
"É de saudar qualquer evolução positiva, nomeadamente o aumento das transições em nove por cento e a diminuição das retenções em oito por cento entre os alunos com planos de recuperação. Mas, globalmente, o número de retenções continua a ser uma tragédia", avalia Albino Almeida.
O presidente da Confap considera que "a falha" resulta do facto de os planos assentarem "num tripé - escola, aluno e família - com dois pés de duvidosa sustentabilidade". "A legislação manda que se envolva a família mas, na maior parte dos casos, os pais destas crianças estudaram menos do que os filhos ou já não se lembram do que aprenderam ou têm dois empregos para os sustentarem, não dispondo de conhecimentos e de tempo para os apoiarem", especifica.
"Processo burocrático"
Em relação aos alunos, "crianças completamente desmotivadas", Albino Almeida acredita que a solução é "antecipar a orientação vocacional e aumentar e diversificar as alternativas de formação profissional". Não culpa os professores: "Para além de ser difícil envolver o aluno e a família, o processo é complexo e burocrático", considera.
Aquela é uma ideia que Ana Paula Cardoso, docente de Português e membro do Conselho Nacional da Associação Nacional de Professores, reforça: "Passa pela cabeça de alguém que olhemos para um aluno com dificuldades e não façamos os possíveis e os impossíveis para o ajudar? Antes de a lei a isso obrigar já nós fazíamos o previsto nos actuais planos de recuperação; só não perdíamos tanto tempo a preencher papeladas."
Ana Paula Cardoso e Pedro Araújo, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, alertam que a "atenção individualizada a um aluno não se decreta". "É necessário criar condições que não existem: as turmas têm um número demasiado elevado de alunos, dos quais vários com planos de apoio e de recuperação; os programas das diversas disciplinas são extensos; não há professores disponíveis para darem o número de aulas de apoio que seria desejável...", enumera Pedro Araújo.
Ambos reclamam, como o presidente da Confap, a reavaliação das medidas. "Irão verificar que a maioria recupera à semelhança do que acontecia antes, sem despachos e burocracias", assegura Ana Paula Cardoso. Alerta que, "muitas vezes, um professor ter tempo para se sentar com um aluno e conversar durante uma hora é mais proveitoso do que dar-lhe cem horas de aulas de apoio". "Confiem em nós, deixem-nos trabalhar", pede.
C.M.
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