sábado, 31 de outubro de 2009

A saúde como perspectiva


O objectivo do Media Smart é fornecer às crianças ferramentas que as ajudem a compreender e interpretar a publicidade, preparando-as para fazerem escolhas informadas.

Divulgamos hoje o texto do perito Media Smart da área da saúde, Dr. Pedro Ribeiro da Silva.




A saúde como perspectiva

As crianças que actualmente têm até 12 anos, vivem uma realidade muito diferente da dos seus pais quando tinham a mesma idade, e quase não existem pontos de comparação com o quotidiano dos seus avós quando eram crianças.

Hoje, um jovem é diariamente, exposto a muito mais informação que os seus pais ou avós foram, na sua época.

Em Portugal, uma criança entre 7 e os 10 anos vê em média 16 horas de televisão por semana. Nesse período de tempo assistem a múltiplos programas e centenas de spots publicitários com informação profusa sobre quase todas as áreas da vida e do consumo.

Por ser tão abundante, parte dessa informação é divergente ou pode até opor-se ou ser antagónica.

A informação é benéfica e fundamental para a autonomia e crescimento individual, todos os dias fazemos inúmeras escolhas, para as quais é necessário estar fundamentadamente informado.

No entanto, é frequente ver jovens e adultos fazerem, por exemplo, determinadas escolhas alimentares por pensarem que são as mais adequadas, mas que são exactamente o oposto.

A informação que as baseia é parcelar ou confusa e acaba por resultar no contrário do seu objectivo.

Esta situação torna-se ainda mais complexa por a oferta disponível no mercado se ter expandido enormemente.

Ao comparar a quantidade de produtos alimentares disponíveis, actualmente, com o período de há 20 anos ou de há 40 anos, verifica-se que a oferta aumentou muitíssimo o que complexifica a escolha.

E os factores que condicionam uma simples escolha alimentar também aumentaram imenso.

Há 40 ou mesmo 20 anos, as preocupações com ómega 3, bifidus, licopene, calorias, anti-oxidantes, era praticamente inexistente.

As escolhas eram muito mais simples de fazer.

Devido a existir tanta informação que é difícil de gerir individualmente perante as decisões do quotidiano, verifica-se que este aumento de informação é acompanhado por mecanismos psicológicos de diminuição da ansiedade. Com frequência, acabamos por fazer as nossas escolhas com pouca informação, porque de outra forma qualquer decisão poderia implicar muito stress ou provocar até bloqueio mental com incapacidade de opção.

Esta estrutura, que Abraham Moles descreve como cultura mosaico, significa que temos muita informação disponível, mas essa informação é usada individualmente de forma aleatória, desordenada e fragmentada.

Actualmente, recebemos mais informação através dos meios de comunicação que através das relações interpessoais, as decisões são mais individuais e menos partilhadas, como se passava até há poucos anos, em que grande parte da informação provinha das pessoas próximas, era em menor quantidade e menos contraditória.

Warwick Cairns, num livro publicado em Inglaterra, em 2008, descreve este fenómeno, baseando-se em dados estatísticos do Reino Unido e Estados Unidos da América.

Cairns, explicita que nos anos 70 do século XX, a maioria das crianças podia ir a pé para a escola, andar de bicicleta e brincar na rua. Nos anos 90, tudo tinha mudado. Em vinte anos, a superfície em que uma criança se pode mover livremente diminuiu 9 vezes. Em 1970, oito em dez crianças iam a pé para a escola, já em 2007, apenas uma em cada dez.

Este aumento da sedentariedade, devido em grande parte a questões de segurança, é uma das razões para as crianças verem várias horas de televisão diária e fazerem menos exercício físico. Como explicita Cairns, baseando-se num estudo de 2007, em Inglaterra, verificou-se que aos onze anos só um rapaz em vinte faz a actividade física aconselhável para a sua idade e que, nas raparigas, apenas uma em cada 250. Possivelmente este facto está relacionado com os 25% de jovens dos onze aos quinze anos que são clinicamente obesos, sendo a sua tendência para aumentar.

A percepção do risco passou a estar muito marcada pela informação dos meios de comunicação social, que com frequência, influenciam mais os comportamentos das pessoas que a própria realidade.

Morreram 5 pessoas em Inglaterra devido à BSE e não morreu ninguém devido à gripe das aves, no entanto, essas duas situações provocaram um medo generalizado por toda a Europa, com grande decréscimo do consumo de carne de bovino e de aves, respectivamente.

A informação profusa sobre os diversos produtos e situações do quotidiano tornam difícil uma decisão e são de valorizar todas as estratégias que permitam o enquadramento dessa informação.

Por essa razão, é de saudar o aparecimento de um projecto como o Media Smart, que tem como objectivo principal aumentar a literacia sobre a Publicidade nos seus diversos meios.

O projecto foi testado em outros países e adaptado à realidade portuguesa.

Destina-se a crianças dos 7 aos 11 anos, e consideramos que toda a estratégia pedagógica e os materiais didácticos produzidos podem ser um excelente contributo para que os alunos pensem a publicidade de uma forma crítica, tornando-se num utensílio importante para fazerem escolhas coerentes.

Os responsáveis do Projecto convidaram técnicos de áreas institucionais como a educação, a defesa do consumidor e a saúde, para que em conjunto pensassem o programa Media Smart a sua execução e implementação.

Desse trabalho conjunto, surgiram várias alterações ao programa inicial, de modo a adapta-lo à realidade portuguesa.

Parece-nos que o Media Smart é já um sucesso, pela qualidade dos materiais pedagógicos, pela sua implementação em muitas escolas, assim como pelo testemunho de alunos, professores e pais.

Pedro Ribeiro da Silva
Direcção-Geral da Saúde

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