Habituamo-nos a grandes e a muito dispendiosos projectos de investigação em educação. Não ficamos, ao mesmo tempo, menos desiludidos com o seu insucesso em fornecer soluções eficazes para os prementes problemas educativos. Uma das razões para tal, que tratarei aqui através de um simples, embora revelador, exemplo, poderá ser que, como aquele homem que deixou cair o seu relógio numa sarjeta, mas que o foi procurar junto a uma loja afastada porque aí havia mais luz, os investigadores em educação com muita frequência incidem onde a luz – as suas teorias da aprendizagem e capacidades, as suas técnicas e os seus financiadores, por exemplo – é melhor do que no lugar onde o problema reside. Alternativamente, podem encontrar imensas coisas a tapar o relógio e não conseguir ver para além delas. A experiência que eu gostaria de discutir não custou nada e não foi sujeita a uma rigorosa avaliação, porém diz-nos bastante acerca de como é difícil encontrar o relógio. Aconteceu numa escola secundária inglesa que investiu fortemente em
tecnologias de informação e comunicação (TIC) e fez uma ampla utilização destas no ensino. A experiência consistiu em organizar para todos os alunos de um dado ano escolar a recepção das suas lições em casa, através dos seus computadores, durante um dia. Os resultados foram claramente inesperados, mas que fazem rapidamente sentido quando pensamos sobre eles. A primeira reacção veio dos pais, que não ficaram satisfeitos com o facto de terem de faltar um dia ao trabalho, ou por terem de arranjar alguém para lhes tomar conta dos filhos enquanto estes estavam a ter ‘escola em casa’. Outra resposta pouco comum veio dos alunos, que longe de terem gostado de estar um dia sem escola, ficaram aborrecidos porque não lhes foi possível estar com os seus amigos. É especialmente interessante a resposta dos alunos; muitos deles passaram o dia a enviar mensagens aos amigos, o mais das vezes, supomos, do mesmo tipo daquelas que sussurram aos colegas na sala de aula – ‘o que é que respondeste a esta?’ Da mesma forma, os professores teriam preferido ter as suas lições ‘normais’, onde pudessem ver os seus alunos, reagir em relação a eles, etc., e especialmente teriam preferido confiar numa miríade de técnicas de linguagem corporal e outras formas tácitas de transmitir não só o conhecimento, mas também aprovação e desaprovação do que codificar toda a sua aula.
Inúmeras lições sobre a educação e sobre a investigação acerca dela podem ser retiradas deste exemplo, mas quatro são-me particularmente evidentes. A primeira, e a mais óbvia, é que a educação, certamente quando equacionada como escolarização, como o é por todo o mundo (poder-se-ia, por exemplo, notar aqui que o Objectivo de Desenvolvimento do Milénio para a Educação é ‘acesso ao ensino primário para todas as crianças’), envolve muito mais do que aprender, ou ensinar e aprender. Está profundamente impregnada nas estruturas sociais mais amplas, no mercado de trabalho quer dos adultos, quer dos jovens. Mais, não se trata de uma mera ‘corrupção’ ‘moderna’ de um originalmente puro sistema educativo; eu penso que, por exemplo, a primeira escola em Genebra precedeu o Colégio de Calvino em mais de um século; não foi fundada para potenciar a aprendizagem, que já era eficientemente providenciada por um pequeno exército de tutores individuais, mas por razões de segurança, como um lugar onde todos os jovens poderiam ser reunidos para impedir que causassem ofensas e distúrbios públicos. E há, é claro, muitos outros exemplos de objectivos ‘não educativos’ da escolarização que enquadram aquilo que hoje entendemos por educação.
A segunda lição vem das reacções dos alunos. Se é verdade que podem ir para a escola principalmente para se encontrarem com os amigos, também o é que eles reconhecem esta como um lugar onde se espera e se encoraja que eles aprendam. Produz-se, assim, uma espécie de elemento sub-reconhecido do currículo oculto da escolarização — que aprender é uma actividade social. Mas, e antes que os psicólogos comecem a rasgar esta página, tem que ser dito que se a aprendizagem de um curso é uma actividade social, aprender em turmas de 30, 40, ou 15, é um tipo particular de aprendizagem social, e se isto não for clarificado e compreendido, então todo o valor do insight provavelmente se perderá. A terceira lição é muito simples, reconhecida na retórica, mas raramente tida em conta nas práticas de inovação educacional, por exemplo – que as primeiras duas lições tornam a educação muito difícil de transformar, especialmente no que diz respeito à organização da aprendizagem. E, finalmente, o facto das TIC serem centrais para esta experiência está longe de ser irrelevante. É através da existência e potencial para a aprendizagem das TIC que estamos em condições de reconhecer estas coisas mais claramente; e é através das evidências que emergem das experiências com as TIC que podemos ver como será difícil realizar todo o seu potencial em educação.
Roger Dale
Roger Dale
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