Há artigos de opinião que falam por si…transcrevemos, com a devida vénia, parte do artigo de Helena Matos, inserido no "Público" de dia 17 de Junho, a propósito do encontro de Educação Especial e das declarações de Valter de Lemos. Comentários, para quê?
Não, não foram as estradas bloqueadas. Nem os piquetes de pescadores revistando os carros de quem por ali passava. O sinal de que o espelho se partira chegou naquela gargalhada. Quase dois mil assistentes lançaram uma sonora gargalhada, quando ouviram um secretário de Estado anunciar mais um estupendo desígnio para daí a poucos anos. O governante em questão ocupa-se das matérias da educação e no caso concreto proclamou aos técnicos presentes naquele encontro que, em 2013, a escola será totalmente inclusiva. Esta gargalhada é a mais dura resposta e o mais terrível sinal dado até agora a qualquer governante em Portugal.
Ninguém se levantou, ninguém pediu a palavra para dizer ao secretário de Estado que os presentes, ou pelo menos alguns deles, não consideram que a integração nas escolas comuns seja benéfica para todas as crianças deficientes. Não aconteceu nada daquilo que seria previsível numa democracia. Simplesmente os presentes desataram a rir. Este riso é o mais claro sintoma do descrédito que se instalou na sociedade portuguesa.
Há algum tempo, as palavras do secretário de Estado Valter Lemos teriam sido glosadas por alguns dos presentes que teceriam loas à escola inclusiva. Aliás, boa parte do encontro teria sido passada com os mil e setecentos presentes acenando as cabecinhas diante duns esquemas em que setas diligentes antecipavam os maravilhosos resultados que decorreriam da implementação daquela proposta. Todas as perguntas provenientes da assistência seriam uma espécie de mote para que os senhores do ministério produzissem ditirâmbica prosa poética sobre a inclusão. Cairia imediatamente o Carmo e a Trindade em cima de alguém que no meio desta radiosa visão comentasse os abusos de escolas e famílias que não hesitaram em colocar levianamente o rótulo das necessidades especiais aos seus filhos e alunos, para assim terem acesso aos apoios devidos a estas crianças. Outras discussões sobre o assunto ficavam também imediatamente arrumadas, pois só por masoquismo alguém enveredaria por questionar o dogma básico da própria escola inclusiva, ou seja, a estratégia que leva a que, para ilustrar o nosso superior apego à igualdade, se obriguem, contra o parecer das famílias e dos técnicos, crianças com determinadas deficiências a frequentar o ensino regular.
Agora que o sortilégio se quebrou, os outrora beatíficos assistentes riem. Não por falta de educação. Muito menos por desprezo. Riem com aquele riso que se cruza com o choro e que nos diz que já não há nada a fazer. O secretário de Estado, coitado, tentou emendar a coisa e ainda declarou que as pessoas riam porque estavam de tal modo habituadas a que as promessas não fossem cumpridas que desatavam a rir, quando ouviam um governante traçar metas tão ambiciosas. Não serei eu quem vai censurar Valter Lemos. Qualquer vaia ou apupo é uma manifestação de afecto ao lado da gargalhada com que foram recebidas as suas palavras.
O secretário de Estado não percebeu ou não quer perceber que aquilo que se desfez à sua frente foi o cenário da enorme representação em que se transformou o poder político. O discurso político começou por se desfazer da ideologia e acabou reduzido a uma espécie de livro de auto-ajuda. Daqueles que garantem que se acreditarmos muito numa coisa ela acontecerá. Pode pasmar-se com a dose de credulidade necessária para que alguém acredite que se desejar muito uma coisa ela acabará por se tornar realidade, mas na verdade é esta espécie de panaceia que rege hoje quem nos governa.
Helena Matos
Não, não foram as estradas bloqueadas. Nem os piquetes de pescadores revistando os carros de quem por ali passava. O sinal de que o espelho se partira chegou naquela gargalhada. Quase dois mil assistentes lançaram uma sonora gargalhada, quando ouviram um secretário de Estado anunciar mais um estupendo desígnio para daí a poucos anos. O governante em questão ocupa-se das matérias da educação e no caso concreto proclamou aos técnicos presentes naquele encontro que, em 2013, a escola será totalmente inclusiva. Esta gargalhada é a mais dura resposta e o mais terrível sinal dado até agora a qualquer governante em Portugal.
Ninguém se levantou, ninguém pediu a palavra para dizer ao secretário de Estado que os presentes, ou pelo menos alguns deles, não consideram que a integração nas escolas comuns seja benéfica para todas as crianças deficientes. Não aconteceu nada daquilo que seria previsível numa democracia. Simplesmente os presentes desataram a rir. Este riso é o mais claro sintoma do descrédito que se instalou na sociedade portuguesa.
Há algum tempo, as palavras do secretário de Estado Valter Lemos teriam sido glosadas por alguns dos presentes que teceriam loas à escola inclusiva. Aliás, boa parte do encontro teria sido passada com os mil e setecentos presentes acenando as cabecinhas diante duns esquemas em que setas diligentes antecipavam os maravilhosos resultados que decorreriam da implementação daquela proposta. Todas as perguntas provenientes da assistência seriam uma espécie de mote para que os senhores do ministério produzissem ditirâmbica prosa poética sobre a inclusão. Cairia imediatamente o Carmo e a Trindade em cima de alguém que no meio desta radiosa visão comentasse os abusos de escolas e famílias que não hesitaram em colocar levianamente o rótulo das necessidades especiais aos seus filhos e alunos, para assim terem acesso aos apoios devidos a estas crianças. Outras discussões sobre o assunto ficavam também imediatamente arrumadas, pois só por masoquismo alguém enveredaria por questionar o dogma básico da própria escola inclusiva, ou seja, a estratégia que leva a que, para ilustrar o nosso superior apego à igualdade, se obriguem, contra o parecer das famílias e dos técnicos, crianças com determinadas deficiências a frequentar o ensino regular.
Agora que o sortilégio se quebrou, os outrora beatíficos assistentes riem. Não por falta de educação. Muito menos por desprezo. Riem com aquele riso que se cruza com o choro e que nos diz que já não há nada a fazer. O secretário de Estado, coitado, tentou emendar a coisa e ainda declarou que as pessoas riam porque estavam de tal modo habituadas a que as promessas não fossem cumpridas que desatavam a rir, quando ouviam um governante traçar metas tão ambiciosas. Não serei eu quem vai censurar Valter Lemos. Qualquer vaia ou apupo é uma manifestação de afecto ao lado da gargalhada com que foram recebidas as suas palavras.
O secretário de Estado não percebeu ou não quer perceber que aquilo que se desfez à sua frente foi o cenário da enorme representação em que se transformou o poder político. O discurso político começou por se desfazer da ideologia e acabou reduzido a uma espécie de livro de auto-ajuda. Daqueles que garantem que se acreditarmos muito numa coisa ela acontecerá. Pode pasmar-se com a dose de credulidade necessária para que alguém acredite que se desejar muito uma coisa ela acabará por se tornar realidade, mas na verdade é esta espécie de panaceia que rege hoje quem nos governa.
Helena Matos
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